Por André Azenha
Criado por Jerry Robinson, Bill Finger e Bob Kane e apresentado em Batman #1 (abril de 1940), Coringa (Joker, no original) é um dos maiores vilões da cultura pop.
A versão mais difundida é que os autores buscaram inspiração em O Homem que Ri, filme mudo norte-americano de 1928 dirigido pelo cineasta expressionista alemão Paul Leni e estrelado por Conrado Veidt.
Baseado no romance homônimo de Victor Hugo (de Os Miseráveis), traz Veidt como Gwynplaine, de face desfigurada e sorriso perene, composição que seria praticamente transposta para o Palhaço do Crime, de rosto maquiado e risadas macabras.
Até a criação de Batman buscaria inspiração no cinema mudo: em A Marca do Zorro (1920), com Douglas Fairbanks e no expressionismo alemão, especialmente Nosferatu: Uma Sinfonia de Horrores (1922), de F. W. Murnau. Mas é um filme mudo de 1926 que chama a atenção: The Bat, de Roland West, apresenta diversos aspectos que seriam usados anos depois por Kane e Bill Finger no desenvolvimento do bat-universo.
Em 2019, quando Batman completou 80 anos de existência, foi justamente o vilão quem chegou aos cinemas num filme-solo de extremo sucesso de público e crítica. Abaixo listamos todos os Coringas do cinema. Mais de uma vez seus intérpretes nos surpreenderam em atuações marcantes, históricas, memoráveis. Só uma deixa a desejar.
PS: A lista não incluir as versões televisivas.
Cesar Romero em Batman, o Homem-Morcego (1966)
O nova-iorquino Cesar Romero (1907-1984) era neto do herói nacional cubano José Martí. Trabalhou com grandes diretores como John Ford, Ernst Lubitsch, Rubens Donaldson, Otto Preminger e Howard Hawks. Durante as filmagens de Aconteceu em Havana se tornou amigo de Carmem Miranda e se apaixonou pelo Rio de Janeiro. Visitou a cidade duas vezes, uma delas no Carnaval de 1946 ao lado do ator Tyrone Power, de quem era amigo íntimo. Fez muitos papéis como o “amante latino”. Na clássica série Batman (1966-1968) deu vida a um Coringa ensandecido, pirado, exagerado como a época pedia. Não era problema se o bigode coberto de maquiagem ficava perceptível. O ator não queria se desfazer daquilo que, segundo ele, tinha lhe proporcionado tantos trabalhos. O longa-metragem Batman, o Homem-Morcego, de 1966, foi produzido para as telonas visando divulgar o seriado no exterior. Está na lista dos “60 maiores vilões de todos os tempos”, pela TV Guide.[
Jack Nocholson em Batman, O Filme (1989)
Um pouco fora de forma para o papel, é verdade, o premiado astro foi a escolha perfeita – nomes como Robin Williams chegaram a ser cogitados – para viver alguém enlouquecido. Afinal, ele esteve em Easy Rider (1969), Um Estranho no Ninho (1975, pelo qual recebeu o Oscar) e O Iluminado (1980). Esperto, decidiu aceitar o papel desde que recebesse uma porcentagem dos lucros do filme. Angariou cerca de US$ 60 milhões, o maior cachê pago para alguém por um único longa. Muito tempo antes de Robert Downey Jr. receber US$ 50 milhões para ser o Homem de Ferro do Marvel Studios. Aparece mais tempo em cena que Michael Keaton (Bruce Wayne/Batman) e seu nome surge em primeiro lugar nos letreiros. Conseguiu uma indicação ao Globo de Ouro para ator em comédia/musical.
Mark Hamill em Batman: As Máscara do Fantasma (1993)
Com os sucessos dos filmes de Tim Burton em 1989 e 1992, a Warner/DC planejou a famosa e celebrada série animada do Batman, produzida pelo “Midas” da empresa, Bruce Timm. Também foi concebido um longa de animação distribuído em circuito selecionado nos EUA, para o Natal: Batman: A Máscara do Fantasma (1993). Mais sombria, a animação, dirigida por Timm em parceria com Eric Radomski (egresso do seriado da TV), por incrível que pareça, conseguiu captar melhor o espírito das histórias do personagem que os filmes live action e recebeu indicação ao Annie Awards, o Oscar do gênero. Para a dublagem, uma sacada espetacular: a escalação do “Luke Skywalker” Mark Hamill para o Coringa. O sucesso do filme foi tanto que ganhou uma versão em quadrinhos, consolidou as adaptações dos gibis no departamento de animações da Warner (nos anos 2000 diversos longas animados seriam lançados diretamente em home vídeo) e é até hoje uma das versões fora das páginas preferidas dos fãs. Hamill dublaria o personagem em outras ocasiões, como o longa-metragem A Piada Mortal, baseado na célebre graphi novel, e exibido durante uma noite nos cinemas em 2016.
Heath Ledger em Batman: O Cavaleiro das Trevas (2008)
O ator australiano vinha num crescendo profissional que culminou na indicação para o Oscar de melhor ator por O Segredo de Brokeback Mountain (2005). É o tipo de intérprete que vivencia o personagem. Todas as expectativas se confirmaram diante de uma interpretação histórica. Seu Coringa não é um mero “palhaço do crime”. É um sujeito que dá medo. Quando ele aparece já se sabe que algo muito ruim pode acontecer. A forma como compôs o vilão – o modo de andar, de lamber os lábios e a fala fantasmagórica, mais o visual borrado, com um “quê” de O Corvo (1994, de Alex Proyas) -, faz o Coringa de Jack Nicholson, tão elogiado à época do primeiro Batman de Tim Burton, parecer brincadeira de criança. A atuação do falecido ator ganhou reconhecimento mundial, rendendo muitos prêmios póstumos a ele, inclusive o Oscar. Hedger faleceu em 22 de janeiro de 2008, vítima de overdose acidental de medicamentos prescritos. Na preparação para viver o Coringa, chegou a criar um diário no qual anotava coisas que o vilão poderia gostar, como a AIDS. O caderno foi divulgado pelo próprio pai do ator e é visto no documentário Too Young to Die: Heath Ledger. Na cerimônia do Oscar em 2009, seu pai, sua mãe e sua irmã receberam a estatueta. O Coringa de Ledger frequentemente aparece nas primeiras posições entre os maiores vilões da história do cinema.
Jared Leto em Esquadrão Suicida (2016)
Um Coringa para esquecer. Quando Jared Leto foi anunciado a expectativa foi lá em cima. O ator, vencedor do Oscar de coadjuvante por Clube de Compra Dallas (2013) tinha um currículo interessante. Mas naufragou junto com toda a equipe num filme com jeitão de Frankenstein. Seu Coringa é um Mafioso inspirado porcamente no Tony Montana de Al Pacino em Scarface (1984). Usa correntões, tem tatuagens e zero carisma. Virou piada entre fãs e crítica especializada. Ele retornaria em 2021, numa versão um pouco melhorada, na Liga da Justiça de Zack Snyder.
Zach Galifianakis em Lego Batman: O Filme (2017)
Egresso das comédias, em especial a trilogia de sucesso Se Beber, Não Case, Zach Galifianakis dubla um Coringa carente, divertido, carismático, que traz um pouco das versões dos anos 60, 80 e de 2008 e não quer nada além do reconhecimento do seu algoz: Batman não seria Batman sem o Coringa. Uma das melhores versões do vilão em um dos melhores filmes do homem-morcego.
Joaquin Phoenix em Coringa (2019)
Um dos maiores atores de sua geração, Phoenix mergulha de corpo em alma, tal qual Heath Ledger, em seu personagem. Protagoniza o primeiro filme solo de um vilão dos quadrinhos. O longa dirigido por Todd Phillips (Se Beber, Não Case) busca inspiração justamente em obras-primas dos anos 70 como Taxi Driver (1976), Touro Indomável (1980) e também O Rei da Comédia (1982), todos longas de Martin Scorsese. Em comum, todas essas obras apresentam personagens principais errantes, deslocados, vítimas de uma sociedade insana, desigual e opressora. Recebeu o Leão de Ouro no Festival de Veneza. E Phoenix arrebatou todos os prêmios da temporada, inclusive o Oscar de melhor ator. Pois é, o Coringa rendeu dois Oscars a atores que o viveram nos cinemas.
Barry Keoghan em Batman (2022)
SPOILERS!
Os vilões do longa dirigido por Matt Reeves são o Charada (Paul Dano) e o mafioso Carmine Falcone (John Turturro). Mas no fim, com o Charada preso, temos o deslumbre de Barry Keoghan (Eternos) como um prisioneiro numa cela próxima. Há a risada, mas não dá para vermos muito das feições do personagem.
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