Um dos grandes filmes de Akira Kurosawa (1910-98), realizado imediatamente antes de Os Sete Samurais. É uma tocante meditação sobre o valor da vida e a súbita percepção desse valor frente à morte iminente.
O velho burocrata (vivido com grande sensibilidade por um dos atores prediletos do diretor, Takashi Shimura) é obrigado a encarar a mediocridade e a falta de razão de ser de uma vida passada atrás de uma mesa carimbando papéis inúteis, e a partir daí embarca em uma jornada, obviamente amarga, para recuperar em poucos meses a humanidade desperdiçada durante toda uma vida.
Kurosawa nos mostra, com delicadeza e compaixão, as tentativas do pobre velho de reaprender a desfrutar dos prazeres da vida, a amar uma moça, sua ânsia de retomar o vínculo perdido com o filho único.
Mas tudo está desconectado do seu momento certo e só resta a ele, que rememora em um momento que quase morreu afogado na infância, lutar para dar um último respiro de vitalidade e existência através de um gesto de imenso simbolismo. Como pano de fundo desse drama humano há ainda uma dura crítica ao poder público do Japão da época, ineficaz e indiferente ao sofrimento popular (e que não deixa nada a dever ao que acontece no Brasil ainda hoje).
Kurosawa nos narra tudo isso de forma tecnicamente brilhante, com muitos movimentos de câmera elaborados, metáforas visuais, música habilmente usada para comentar os acontecimentos, flash-backs precisos.
Também foi genial mostrar tudo em dois tempos, primeiro o condenado funcionário público tentando recuperar sua vida perdida e depois, na longa seqüência do velório, seus amigos e parentes desajeitadamente tentando decifrar seus meses finais, repletos de atitudes aparentemente estranhas.
Com isso Kurosawa nos mostra que o verdadeiro viver é interior, solitário, único e muitas vezes incompreensível para os olhos alheios, iludidos com as atitudes convencionais e socialmente esperadas.
Um belíssimo filme, sucesso na época mas pouco exibido no Brasil e que deve ser descoberto. Apesar de ter sido depois muito imitado. A cópia mediana, não restaurada, não chega a comprometer.
Título original: Ikiru (生きる)
Título no Brasil: Viver
Ano de lançamento: 1952
Diretor: Akira Kurosawa
Roteirista: Akira Kurosawa e Shinobu Hashimoto
Diretor de fotografia: Asakazu Nakai
Trilha sonora: Fumio Hayasaka
Duração: 143 minutos.
Duração: 143 minutos.
Elenco:
- Takashi Shimura (Kanji Watanabe)
- Shinichi Himori (Kimura)
- Haruo Tanaka (Sakai)
- Minoru Chiaki (Noguchi)
- Miki Odagiri (Toyo Odagiri)
- Bokuzen Hidari (Ohara)
- Minosuke Yamada (Médico)
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