Crítica | Vitória: Fernanda Montenegro brilha ao viver senhora que ousou denunciar o crime

É admirável ver uma mulher aos 90 e poucos anos fazendo questão de trabalhar e ainda carregar um filme com tamanho vigor. Fernanda Montenegro está sublime em Vitória, filme inicialmente dirigido por Breno Silveira, que faleceu durante as filmagens, e foi concluído por Andrucha Waddington.

Acompanhamos Nina (Fernanda Montenegro), inspirada em Joana da Paz, uma senhora que trabalha como massagista e mora em um prédio de frente para uma boca do tráfico de drogas. Indignada com a violência escancarada e a ineficiência da polícia, ela decide comprar uma câmera e registrar tudo, até encontrar um jornalista, Fábio Gusmão (Alan Rocha), que a ajuda a levar o caso para uma policial, Laura Torres (Laila Garin), disposta a abrir uma investigação.

Na vida real, Joana da Paz precisou entrar para o Serviço de Proteção a Testemunhas e viveu reclusa até seu falecimento em 2023. Ninguém sabia como ela era fisicamente – sua altura, a cor da pele, se usava óculos ou não.

Andrucha, genro de Fernanda Montenegro, tinha à disposição a maior atriz que este país já viu e, obviamente, soube aproveitar. Aos 90 e poucos anos, Fernanda carrega o filme nas costas, apoiada por um elenco coadjuvante muito bom, mas cujos personagens não são tão desenvolvidos porque o foco está no dia a dia da protagonista. Ela ajuda um garoto da comunidade, Marcinho (Thawan Lucas), faz amizade com uma vizinha, Bibiana (Linn da Quebrada), vai dançar no bingo, toma seu licorzinho e tem a coragem que o Estado não tem de enfrentar o crime, que, além dos traficantes, inclui policiais corruptos.

Apesar de produzido pela Conspiração Filmes e pela Globoplay, e distribuído pela Sony – as mesmas empresas por trás de Ainda Estou Aqui – e de contar com Fernanda Montenegro no elenco, Vitória não é Ainda Estou Aqui e nem pretende ser. São obras de estéticas, narrativas e orçamentos completamente diferentes. E dentro do que propõe, Vitória é um ótimo filme ao retratar uma realidade brasileira que, em alguns momentos, lembra Aquarius, de Kleber Mendonça Filho.

Dona Nina se recusa a sair do apartamento pelo qual lutou tanto para conseguir, assim como Clara, personagem de Sônia Braga em Aquarius, que resiste à especulação imobiliária e à pressão para deixar seu lar. Em Ainda Estou Aqui, foi Eunice quem não se curvou aos golpistas. Três filmes protagonizados por três mulheres fortes, enfrentando injustiças absurdas causadas pela desigualdade e pela ganância dos poderosos no Brasil.

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